11 fevereiro 2010

Música - a profissão e o dom















"Pra ser músico, só precisa ter dom", dizem muitos. Alto lá. Precisa ser também muito profissional. Preocupar-se com equipamento, ter técnica razoavelmente em dia, agendar datas e ensaios, chegar na hora certa, apresentar-se com roupa bonita. Além disso, tocar sem saber quanto vai ganhar no fim da noite, pois o couvert artístico é variável e só vale a pena se for em um lugar de grande circulação, e se o músico também tiver feito a divulgação de sua apresentação (mais uma atribuição). Depois de tudo isso, o músico ainda se depara com enormes controvérsias em relação a sua atuação no mercado musical, em relação a questões como autoria e pagamento de direitos autorais, precária legislação trabalhista e indefinição de sua função em ambientes com música (música em bar é entretenimento ou é mero serviço, como o de um manobrista?).

Será que a única coisa que define o músico é apenas o talento artístico? Músicos talentosos há vários, mas são poucos os que têm o mesmo talento pra produção, divulgação, contabilidade, logística, negociação e marketing. O bom músico tem que ter sim uma qualificação mínima para tocar ou cantar, mas hoje ele ainda tem que ser bom em diversos outros saberes e funções. Junte-se a isso o fato de ninguém saber direito o que é direito (e o que é dever) dos músicos, devido a desregulamentação da profissão, está pronta a confusão: o músico fica à mercê de um mercado cultural ainda incipiente e imaturo para da-lhe o devido valor.

A visão romântica da figura do músico - a do ser que anda por aí com seu violão debaixo do braço, tocando nos bailes da vida em troca de pão, sem lenço sem documento - ainda é uma realidade. Vide os atuais debates na Câmara ds Deputados, no Senado e no Supremo Tribunal Federal, instâncias que querem modificar a regulamentação da profissão de músico - ou até mesmo acabar com ela -, que é atualmente regida pela Lei 3.857/60, que criou a afamada Ordem dos Músicos do Brasil (OMB) nos anos 60, no governo de Juscelino Kubitschek.

A discussão e os argumentos envolvem diversos aspectos: lei contra a obrigatoriedade da carteira de músico para realização de apresentações musicais, lei para a regulamentação de apresentações com cobrança de couvert artístico, lei para regulamentação da atividade de compositor, nova legislação trabalhista para músicos. No meio do debate surgem as diferentes visões sobre o que é esse negócio de música, que envolve os profissionais em uma verdadeira rede de negócios: aulas, composição, direção musical, gravação, realização de eventos e shows, apresentaçõs, gravações, entre muitas outras (quem quiser entender um pouco do que é a profissão de músico, aqui tem uma breve história).

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O MPF entrou com ação no ano passado dizendo que a existência da OMB é imcompatível com a Constituição Federal, que garante o livre exercício de atividade artística e expressiva de qualquer natureza, não podendo ser "policiada" por nenhum órgão fiscalizador. Assim como aconteceu com a imprensa, a regulação da profissão será comprometida.

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Em São Paulo, o governador José Serra já promulgou uma lei em 2007 que dispensa os músicos de apresentarem a carteira da OMB em apresentações. Um debate realizado em julho do ano passado na MTV, com o apresentador Lobão e convidados, também mostrou como o papel fiscalizatório da instituição é inadequado, visto que deveria funcionar como órgão de classe - em prol dos profissionais, como um sindicato - e não como regulador. Essa outra matéria aqui dá um pequeno panorama de como está sendo discutida a questão.

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Na Câmara dos Deputados já há um texto conclusivo em tramitação nas comissões de Trabalho e Constituição e Justiça, desde 2007, retirando das atribuições da OMB a fiscalização das condições de trabalho do músico, estabelecendo diretrizes para que as Delegacias do Trabalho (ligadas ao Ministério do Trabalho) façam a devida fiscalização, estabelecendo diferentes jornadas de trabalho e multas para quem desrespeitar as mínimas condições de trabalho para os profissionais.

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No Senado, uma audiência pública realizada em dezembro do ano passado com compositores, pedindo a regulamentação dessa profissão, deu origem a diferentes propostas para futuros projetos de lei. Uma senadora sugeriu que se fizesse como na Bélgica, onde músicos têm seguro-desemprego. Outro senador propôs que o governo comprasse e distribuísse CDs - assim como faz com livros didáticos - para escolas e bibliotecas públicas. Outro senador gostaria que o governo só renovasse a concessão de rádios e TVs para aqueles que comprovassem que pagam direitos autorais, enquanto outro gostaria de abrir uma CPI para investigar a "caixa-preta" da distribuição desses direitos.
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O couvert artístico é tema de um projeto de lei aprovado pela comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados em setembro de 2009. O projeto estabelece que o músico poderá combinar um cachê com o dono do bar, ou então poderá receber o valor integral do valor pago pelos clientes a título de couvert artístico. Um advogado tem um artigo interessante sobre a existência do couvert: já que as casas o cobram, será que não deveria existir então o "meio-couvert" para estudantes e aposentados, como manda a legislação relativa a entrada em eventos de entretenimento e diversão como cinemas e shows?

5 comentários:

  1. Olá Murilo! bacana o blog aqui tbem....
    em relaçao a essas tramitaçoes acho q meia no couvert é uma baita palhaçada, já que o valor ja é baixo na maioria das casas, e se for meia entao, foi-se,,,,,
    Abrs! continuarei acompanhando aqui este excelente blog,,,,,Caio

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  2. Mura, muito bom o texto e o blog.
    Abraço.

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  3. obrigado Caio pelos elogios. Quanto ao meio-couvert, também acho que é uma péssima idéia, mas isso mostra como a sociedade percebe a idéia do couvert - é como uma entrada de show, portanto a idéia do advogado não parece ser tão lunática. Farei um post depois sobre isso, pois a existência desse maldito couvert nunca me convenceu...

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  4. Bom post Murilo! Parabéns!

    PS: Por acaso você não tem o Método Prince Vol. 1 em pdf ou usado pra vender não né?!

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  5. Obrigado Mateus, que bom que gostou do post. Sobre o método, não tenho em pdf, mas se você está interessado em comprar, é uma boa, porque é muito bom mesmo. Tem nesse link aqui, http://www.freenote.com.br/site_v3/produto.asp?shw_ukey=37475162820SYVF23D. Abraço.

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