09 julho 2009

Comunicação é curso, jornalismo é especialização













Do blog "Escrevinhamentos": sátira com o cartaz da Federação Nacional dos Jornalistas

Além dos escândalos do Senado, do "brilho" de Ronaldo no Corinthians e da morte infeliz de Michael Jackson, outro assunto que dominou a pauta de discussões nos botecos foi a decisão do Superior Tribunal Federal de acabar com a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o exercício da profissão.

Acho que exercer a profissão de jornalista requer sim um diploma. Mas não obrigatoriamente de jornalismo. Sempre afirmei que o canudo de jornalismo não valia muita coisa. Pra mim, jornalismo não é uma área de conhecimento humano, é uma prática especializada. A ciência da Comunicação sim, é um ramo do saber. E se hoje os jornalistas reclamam que sua profissão foi desvalorizada com a decisão do STF, que fiquem sabendo que a culpa é totalmente deles próprios. Quem mandou não quererem serem chamados de bacharéis em Comunicação, como são conhecidos os advogados antes de prestarem um exame de aptidão para exercer o ofício?

O ministro Gilmar Mendes, pelo qual não tenho a mínima simpatia, até que fez uma comparação interessante da profissão de jornalista com a de cozinheiro - que despertou a ira de muitos, mas que achei correta. Quem pede diploma para o chefe de cozinha quando senta na mesa do restaurante? O diploma do cozinheiro não interfere na qualidade da comida, assim como, no caso do jornalista, na qualidade da informação (que já anda muito baixa há anos, até mesmo nas redações mais estruturadas, como da Folha de S. Paulo ou Estadão).

Mas o papel aceita tudo. O estômago, não. Discutir a qualidade dos profissionais do jornalismo é um pouco mais difícil que falar sobre os chefs de cozinha e seus pratos. Aqui sim, há muito o que se debater. O próprio STF, ao abrir um edital para a contratação de jornalista, estava decidindo se exigiria ou não a apresentação de diploma para os candidatos ao concurso. Pois vejam que enrascada: se para ser advogado há que se ter uma "validação" do diploma - a famosa prova da Ordem dos Advogados -, no caso do jornalismo nem o diploma em si agora tem validade, quanto mais a prática dos que o possuem. Tudo ficou mais subjetivo.

Trabalhando como assessor de imprensa, atendi os mais variados tipos de jornalistas. Nunca perguntei se tinham diploma, mas afirmo que a maioria não sabia muito o que estava fazendo. Alguns agindo como garotos de recados, outros como meros "filhos da pauta", outros mal-intencionados. Muito poucos sabiam fazer perguntas, ou argumentar, ou perceber um novo gancho para tratar do assunto que se propunham a investigar. Aliás, fazer perguntas é coisa que se deveria ter aprendido na escola - questionar o mundo com curiosidade é o princípio do saber e também do jornalismo - e na faculdade também não ensinam.

Então, precisamos do diploma?

Entender de Comunicação significa estar a par do estado da arte de todas as questões que envolvem este campo de conhecimento. É coisa de cientista, que debruça-se sobre a informação, a recepção, a produção, o entendimento, a ética, o campo de trabalho, as interfaces com a cultura, novas mídias, assim como um biólogo examina material genético no microscópio eletrônico para a pesquisa de usa tese. É coisa grande e importante.

Entender de Jornalismo - pauta, reportagem, lead, edição, diagramação, off, link, sonora - é basicamente dominar um modo de dizer aliado a um modo de fazer. É manipular um discurso pré-moldado, tentando fazer com que a mensagem passe por um processo de produção e chegue o mais intacta possível à audiência ou público. Coisa pequena, de gestores, burocratas e peões numa linha de montagem.

Mas isso não significa que não é preciso ter cursos para saber como atuar nessa linha de montagem dos veículos de comunicação. Jornalismo de verdade é onde se põem em prática ferramentas e técnicas aliadas a uma bagagem cultural que se desenvolve em todos os campos da vida, e não só da comunicação.

Por isso, não só o jornalista, mas TODOS os que se dispuserem a atuar na área da comunicação, deveriam ter uma diploma sim. Mas de especialização. Na minha visão, Informação é um artigo de valor. Deve ser tratada com respeito. Por quem entende. E, infelizmente, os jornalistas - como são formados hoje - entendem pouco de qualquer outra coisa que não seja o ralo currículo de humanidades e comunicação que tiveram na faculdade. Por isso, defendo sim que não seja preciso ter diploma de jornalista, mas uma ESPECIALIZAÇÃO em jornalismo.

O jornalista aprende teorias da comunicação, semiótica, filosofia, história, português, antropologia, sociologia, mas acaba por não conseguir aplicar essas disciplinas no dia-a-dia da profissão. E também não adianta saber apenas como se escreve uma notícia, como se faz a paginação de um jornal, como se faz um stand-up na tv. Para isso há manuais, que ensinam como usar essas ferramentas. E esse é o foco de muitos cursos de jornalismo por aí. Não é isso que dá direito a um diploma. Pessoas que só sabem manuais são técnicos. É preciso mais que isso.

Permitir que qualquer outro tipo de profissional atue no jornalismo - mesmo sem ter o diploma do curso - é um avanço, pois garante uma melhor pluralidade de idéias e qualidade de conteúdo (pelo menos quero crer que os médicos que se interessarem por atuar em jornais vão falar sobre saúde ou ciência, e não vão começar a escrever sobre cultura ou política). Porém, dispensar que haja algum tipo de preparo para lidar com a ética, a deontologia e o cotidiano da profissão é um erro.

2 comentários:

  1. Eu ainda estou tentando me convencer disso tudo. Existem bons argumentos dos dois lados.

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  2. Eu também concordo que há bons argumentos em favor do diploma de jornalismo, por isso só peço que mudem o status do curso para ESPECIALIZAÇÃO, e não acabem com o reconhecimento de uma formação para a profissão.

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