17 julho 2011

Caminhos da harmonia
















No jazz só há uma regra: seguir a forma da música. Mesmo quando não há forma, segue-se uma direção comum, um rumo, ditado pela sensação, pelo clima, pela vibração do momento. Ouve-se como um reflexo, reflete-se sobre o que se ouve, um contexto se desenha, então responde-se. A música então nasce, e nesse processo já amadurece e cresce, e continua nascendo até morrer.

A Garota de Ipanema, de Jobim e Vinícius, tem uma forma conhecidíssima (AA-B-A) e progressões harmônicas maravilhosas. Porém, quase 50 anos após sua composição, seus acordes já foram autopsiados em vários livros e manuais de análise musical. Até por isso, muitas de suas interpretações em jam sessions ou mesmo gravações de música popular soam enfadonhas, desinteressantes, por ser muito difícil fazer algo novo com ela - no máximo, obtém-se alguma interpretação elegante.

Para uma grande parte de músicos que improvisam sobre o tema da Garota, não há desafios técnicos ou harmônicos. Os acordes vão acontecendo de forma mais que previsível e, compasso após compasso, muitos não conseguem mais ouvir atrativos nas harmonias mais que repisadas e acabam tocando sem pensar muito, criando solos burocráticos ou apenas corretos.

Nem por isso o guitarrista Fábio Leal deixou a música de fora de seu repertório. Ao contrário, propôs um novo arranjo para a Garota, com uma rearmonização ousada, densa, inovadora e interessantíssima. Não que Tom Jobim precise de correção; são nossos ouvidos que precisam de novos desafios, e o genial Fábio percebeu isso. Em seu arranjo, cada um dos "A" tem uma harmonia diferente, e a parte "B" se inicia com um acorde menor [Bbm7(b13) em vez de Gbmaj7] que parece dar um significado mais sombrio à letra (talvez o "Ah, porque estou tão sozinho" soasse com muito mais "solidão" desse jeito...).

O arranjo realmente inspira. O resultado, após um ensaio e uma jam session, foi registrado nesse vídeo abaixo, gravado no último Janela Jazz - evento realizado no Instituto Cultural Janela Aberta, em São Carlos (SP) - com Fabiano Nunes no baixo, Paulo Almeida na bateria e eu no teclado.

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