15 setembro 2010

ETC & Jazz - Programa 01



Pessoal, estreou a primeira edição do ETC & Jazz na Rádio UFSCar. Quem quiser baixar, esse é o link, ou escute aí em cima. Trazendo sons de várias frentes do jazz, das várias fronteiras do estilo - fronteiras territoriais, harmônicas, conceituais, rítmicas, etnoculturais. No programa, proponho a confrontação das bordas, das cercas que dividem (teoricamente) as músicas, mostrando que a mistura e integração são a melhor forma de perenização. A meu ver, o jazz segue exatamente esse caminho - misturar-se para continuar existindo, dando origem inclusive a novas linguagens e enriquecendo a sua própria essência.

A primeira música do programa, uma pequena composição feita da colagem e sobreposição de todas as músicas que tocam na edição, ressalta justamente essa capacidade que o jazz tem de reconfigurar-se. Mesmo que tudo na música já tenha sido tocado, criado, repisado até se tornar linguagem, o ato jazzístico reside justamente na reterritorialização desses elementos musicais. Se John Coltrane já tocou todos os chorus possíveis, efervescentes e densos, vamos tocá-los de novo com guitarras, ou com um vibrafone minimalista, ou então solfejá-los acompanhados de uma cítara e uma tabla. Senão se pode mudar o código, mudamos o contexto, e acabamos por produzir uma nova mensagem, um novo conceito, dando origem assim a novas possibilidades interpretativas.

O rádio é sempre um ponto de partida para novas experiências auditivas. Pode-se ser estritamente informativo, objetivo, sisudo, e ainda assim nós ouvintes tentaremos imaginar a cara do apresentador a ler as notícias com seu tom monótono. E quando estão propostas novas configurações sonoras, a tendência é que os ouvidos estranhem - afinal, reconfigurações sonoras acabam por eliminar ou minimizar as referências territoriais, históricas, estéticas que trazemos no ouvido.

É como perder a bússola interna, ficar sem norte no meio de uma floresta a noite. Tudo o que resta é tentar guiar-se pelos instintos, e isso talvez seja o grande desafio cultural da contemporaneidade - voltar a ouvir como ouvíamos no tempo das cavernas, vulneráveis, frágeis, expostos aos perigos da escuridão. Ouvir jazz como se não tivéssemos fogo, como se estivéssemos na idade da Pedra Lascada, tateando a linguagem, dependendo da audição para enxergar a noite. Encontrar sentidos nos sons que vêm do escuro, que nascemvivemorrem apenas enquanto ainda está escuro e temos ouvidos para vê-los, sentir seu gosto, ferir-se com suas arestas, segurá-los como batatas quentes e soltá-los como labirínticos vagalumes, respingando luzes aqui e ali em nossos devaneios de escuta.

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